"(...) Havia sido um erro comprar a casa sobre a ponte, e um duplo erro ficar com uma do lado oeste. Tinha permanentemente diante dos olhos o rio a correr, e, para ele, era como se fosse junto com a correnteza, ele, a sua casa e a sua riqueza obtidas em decênios, tudo junto com o rio, como se fosse velho e fraco demais para se contrapor à poderosa corrente. Às vezes, quando tinha algo a fazer na margem esquerda, no bairro em torno da Sorbonne e de Saint-Sulpice, não ia pela ilha e pelo Pont Saint-Michel, mas tomava o caminho mais longo, pelo Pont Neuf, pois esta ponte não era cheia de casas. E ele se postava no parapeito leste e ficava olhando rio acima, para ao menos uma vez ver tudo correndo na sua direção; e por alguns momentos se regalava imaginando que a tendência da sua vida se invertera; os negócios floresciam, a família prosperava, as mulheres corriam atrás dele e a sua existência, em vez de diluir, só fazia revigorar-se.
Mas logo, erguendo um pouco o olhar, via a algumas centenas de metros de distância a sua própria casa, tão frágil, estreita e alta sobre o Pont au Change, a janela do seu gabinete de trabalho no primeiro andar, e via a si mesmo parado à janela, olhando o rio e observando a água que seguia correndo, como agora. E com isso desvanecia-se o belo sonho, e Baldini, sobre o Pont Neuf, afastava-se, mais abatido do que antes, tão abatido quanto agora, quando se afastou da janela, foi até a escrivaninha e sentou-se. (...)"