segunda-feira, 27 de julho de 2009
Dia-a-dia
Palavra fumaça fumaça palavra quarto fechado fumaça palavra palavra fumaça quarto fechado quarta palavra fumaça fechado palavra quarto fumaça fechada palavra fechada fumaça quarta palavra fechada fumaça fechado quarto palavra quarta fechado palavra quarto fumaça palavra quarta fechado fumaça fechada quarto palavra fumaça quarto fechado palavra quarto fumaça fechado fumaça fechado fechado fechado fechado fechado fechado fechado fechado fumaça
quarta-feira, 22 de julho de 2009
De volta ao lado de fora
Sonhar, sonhar, sonhar... o maior perigo e a maior necessidade da vida. Os sonhos te causam as maiores tristezas e as maiores felicidades, ambos em graus enormes somente enquanto estes se mantêm em sua cabeça, ainda não realizados.
Este andou sendo meu problema durante todo esse tempo: realismo demais. Por isso eu olho meus textos recentes e vejo vazio, péssima qualidade; olho e vejo quão pouco ando escrevendo (eu sempre escrevi à mão, mas agora me dói o pulso escrever meia página de caderno). Percebi que a desesperança me atacou como nunca e eu acabei desistindo de mim mesmo. Quanta coisa eu perdi pelo fato de nem querer assimilar o que se passava em minha frente, receber no meu cérebro as informações, mas simplesmente as guardar no peso e cansaço de meu olhar, que fica mais triste a cada dia que eu o encaro no espelho.
Mas hoje vejo que por ser um dos mais perdidos na vida, sou o que melhor a encontro; que me perco por acreditar nela.
O maior de todos os sonhadores: Marcelo Riceputi Alcântara

Este andou sendo meu problema durante todo esse tempo: realismo demais. Por isso eu olho meus textos recentes e vejo vazio, péssima qualidade; olho e vejo quão pouco ando escrevendo (eu sempre escrevi à mão, mas agora me dói o pulso escrever meia página de caderno). Percebi que a desesperança me atacou como nunca e eu acabei desistindo de mim mesmo. Quanta coisa eu perdi pelo fato de nem querer assimilar o que se passava em minha frente, receber no meu cérebro as informações, mas simplesmente as guardar no peso e cansaço de meu olhar, que fica mais triste a cada dia que eu o encaro no espelho.
Mas hoje vejo que por ser um dos mais perdidos na vida, sou o que melhor a encontro; que me perco por acreditar nela.
O maior de todos os sonhadores: Marcelo Riceputi Alcântara

"(...)
Se um dia existiu esperança em algum lugar
foi ela quem te disse que sempre vale a pena sonhar"
quinta-feira, 9 de julho de 2009
Canto de caderno
O vento empurra a folha
traz a lembrança morta
puxa, empurra, entorta
O suspiro traz o alívio ilusório
em meio à dor constante
em meio ao medo de ser
O ouvido nos fecha os olhos
Que, olhando a ave, nos intimida
Ouvindo, enxergamos a vida
traz a lembrança morta
puxa, empurra, entorta
O suspiro traz o alívio ilusório
em meio à dor constante
em meio ao medo de ser
O ouvido nos fecha os olhos
Que, olhando a ave, nos intimida
Ouvindo, enxergamos a vida
.
Você dança valsa em meus pensamentos
Brilhante como uma rosa que se esconde no inverno
Ingênua como uma prostituta
Pervertida como uma criança
.
Sua motocicleta ronca em meus sonhos
Livre como Shakespeare em uma casca de noz
Egoísta como uma borboleta em seu casulo
Feliz como o solitário em um deserto
.
"Teu cheiro na rosa dos ventos"
quinta-feira, 18 de junho de 2009
segunda-feira, 15 de junho de 2009
(...)
O que busca, então? Se quando se encontra em seu quarto, passa os dias esperando que o medo, a aventura, o desconhecido venha à sua porta; mas quando sai de casa, toca as ruas escuras da cidade, sente o pêlo arrepiar ao novo, corre e se esconde no velho, na memória de quando tinha a coragem de presenciar o novo. Quanto mais novidades, maior o medo, maior o pudor; ele chega a um ponto onde o novo está em sua memória, mas ele não se lembra do principal: a sensação de se encontrar com ele e encará-lo, prefere visualizar o antigo sem conseguir senti-lo.
Vida medíocre, passar sua vida reproduzindo sensações de sua vida passada em um papel, todas em várias situações diferentes, por não conseguir sair de casa e se arriscar novamente. Vida medíocre, que se passa em sua cabeça, no vôo de seu pensamento, que corre pela janela de seu quarto sem carregar consigo seu corpo, vai até a lua e a toca com sua mão invisível; mas ele só pode imaginar qual é a sensação que ela causa. Corre a vista por todos os livros e lê sobre as pessoas que pararam exatamente onde ele parou, se confortando por alguns serem mais inteligentes e descreverem de forma mais interessante e vívida algo que não lhe soa como novo, mas que o faz deitar a cabeça no travesseiro e pensar que, apesar de belo, não acrescentou nada ao seu dia, ao seu ano, à sua vida.
Onde há uma luz acesa? Não há, as pessoas são felizes, elas são ignorantes e ousadas, não ligam para as conseqüências perante a elas ou às outras pessoas, simplesmente agem sem pensar. Sensação estranha essa, sentar em um bar com vários amigos e esperar como se estivesse sozinho e alguma pessoa de verdade, com um diálogo natural e próprio, fosse aparecer e mudar as coisas, e soprar nele a vida por alguns segundos. Mas isso não vai acontecer, o novo se esconde dele nas coisas mais simples que ele já não tem mais paciência para observar, no olhar ingênuo ou na palavra simples e honesta; no mero dó maior ou na letra de rimas pobres e sem métrica; na rua mais suja ou no mendigo mais bêbado. Não está na ponta do cigarro que cai em seu quarto nem no copo sujo de bebida de ontem que o lembra de sua ressaca, mas na lembrança de sua mãe que estaria chorando ao vê-lo fazer isso ou na garota que ele deixou pra trás por não saber fazê-la feliz.
Aquelas saias levantadas, aquelas bocas fartas e aqueles belos companheiros com quem se embebedava e inventava um sentido pra tudo já não vão mais satisfazê-lo; com o tempo, a pele enruga, o cérebro enjoa, o sentimento exige, o mundo pesa, o novo corre e se esconde.
A tristeza é o velho a ver o nascer do sol.
Vida medíocre, passar sua vida reproduzindo sensações de sua vida passada em um papel, todas em várias situações diferentes, por não conseguir sair de casa e se arriscar novamente. Vida medíocre, que se passa em sua cabeça, no vôo de seu pensamento, que corre pela janela de seu quarto sem carregar consigo seu corpo, vai até a lua e a toca com sua mão invisível; mas ele só pode imaginar qual é a sensação que ela causa. Corre a vista por todos os livros e lê sobre as pessoas que pararam exatamente onde ele parou, se confortando por alguns serem mais inteligentes e descreverem de forma mais interessante e vívida algo que não lhe soa como novo, mas que o faz deitar a cabeça no travesseiro e pensar que, apesar de belo, não acrescentou nada ao seu dia, ao seu ano, à sua vida.
Onde há uma luz acesa? Não há, as pessoas são felizes, elas são ignorantes e ousadas, não ligam para as conseqüências perante a elas ou às outras pessoas, simplesmente agem sem pensar. Sensação estranha essa, sentar em um bar com vários amigos e esperar como se estivesse sozinho e alguma pessoa de verdade, com um diálogo natural e próprio, fosse aparecer e mudar as coisas, e soprar nele a vida por alguns segundos. Mas isso não vai acontecer, o novo se esconde dele nas coisas mais simples que ele já não tem mais paciência para observar, no olhar ingênuo ou na palavra simples e honesta; no mero dó maior ou na letra de rimas pobres e sem métrica; na rua mais suja ou no mendigo mais bêbado. Não está na ponta do cigarro que cai em seu quarto nem no copo sujo de bebida de ontem que o lembra de sua ressaca, mas na lembrança de sua mãe que estaria chorando ao vê-lo fazer isso ou na garota que ele deixou pra trás por não saber fazê-la feliz.
Aquelas saias levantadas, aquelas bocas fartas e aqueles belos companheiros com quem se embebedava e inventava um sentido pra tudo já não vão mais satisfazê-lo; com o tempo, a pele enruga, o cérebro enjoa, o sentimento exige, o mundo pesa, o novo corre e se esconde.
A tristeza é o velho a ver o nascer do sol.
sábado, 6 de junho de 2009
segunda-feira, 1 de junho de 2009
Devaneio
Quero teu sangue quente em minha farta boca
Na raiva, te sinto amor
Na paixão, te sinto ódio
No inverno, desejo teu calor
Quero tua flecha afiada em meu peito
Em cada sonho, uma outra qualquer
Meu cheio se preenche com teu vazio
Em teu pudor, te vejo mulher
Quero cheirar teu corpo e vomitar desejo
Em teu sexo, recitar a canção de meus lábios
Em teu tesão, sinto desprezo
Em tuas carícias, me ponho a sonhar
Quero sentir teu beijo de boca torta
Dentro do teu peito, entrar em tua
dança de menina morta
E, farto do tédio, em teu seio adormecer
Em teu corpo, vejo teu rosto
Em teu rosto, vejo teus olhos
Em teus olhos, vejo tua alma
Em tua alma, te quero matar
Na raiva, te sinto amor
Na paixão, te sinto ódio
No inverno, desejo teu calor
Quero tua flecha afiada em meu peito
Em cada sonho, uma outra qualquer
Meu cheio se preenche com teu vazio
Em teu pudor, te vejo mulher
Quero cheirar teu corpo e vomitar desejo
Em teu sexo, recitar a canção de meus lábios
Em teu tesão, sinto desprezo
Em tuas carícias, me ponho a sonhar
Quero sentir teu beijo de boca torta
Dentro do teu peito, entrar em tua
dança de menina morta
E, farto do tédio, em teu seio adormecer
Em teu corpo, vejo teu rosto
Em teu rosto, vejo teus olhos
Em teus olhos, vejo tua alma
Em tua alma, te quero matar
sábado, 30 de maio de 2009
Down em mim

Eu não sei o que meu corpo abriga
nestas noites quentes de verão
E nem me importa que mil raios partam
qualquer sentido vago de razão
.
Eu ando tão down
Eu ando tão down
Outra vez vou te cantar, vou te gritar
te rebocar do bar
.
E as paredes do meu quarto vão assistir comigo
à versão nova de uma velha história
E quando o sol vier socar minha cara
com certeza você já foi embora
.
Eu ando tão down
Eu ando tão down
Outra vez vou te esquecer, pois nestas horas
pega mal sofrer
.
Da privada eu vou dar com a minha cara
de panaca pintada no espelho
E me lembrar, sorrindo, que o banheiro
é a igreja de todos os bêbados
Eu ando tão down
Eu ando tão down
...
quinta-feira, 21 de maio de 2009
De alguém para alguém
http://www.youtube.com/watch?v=FQrhA6QtWOM
--------------
Escrevo hoje para você porque você é a única pessoa que tenho para escrever. Por mais que você não pense tanto em mim quanto eu penso em você e talvez, na verdade, nem eu pense tanto em você quanto eu acho que penso.
O quarto em que você se encontra é indiferente; seja um hotel em um lugar maravilhoso, seja em um apertado quarto de uma cidade grande, a solidão consegue te encontrar e atacar. Você sai pelas ruas e, quanto mais pessoas passam ao seu redor, mais sozinho e pequeno você se sente.
O escritor é um paradoxo - ele não gosta de escrever, se sentiria eternamente feliz se nunca mais precisasse de um papel; exalta a arte por ser uma válvula de escape.
Eu me pergunto se você enxerga o mundo como eu, se sabe como é árduo ter de ir lá fora. Às vezes me pergunto se sairia se não precisasse comer ou de dinheiro, de vencer nessa batalha insana da vida. Para que sairia do quarto? Mas acontece que a lua e o ar da madrugada trazem o mundo para o escritor e mesmo que ele se tranque em seu quarto, vai estar em contato com as coisas como são. Enquanto houver mundo, mesmo de olhos fechados, o sentirei.
Então, quando a noite ataca mais fortemente, saio na varanda, olho a chuva, procuro nas janelas luzes e pessoas que se sintam como eu, mas não encontro. Penso em que você deve estar fazendo, se está deitada a olhar a luz de um abajur e a pensar nessas coisas, se está dormindo e tendo um sonho feliz, em outro mundo.
Será que realmente tenho o direito de lhe escrever? Alguém que enxerga as coisas dessa forma deve espalhar esse vírus? Será que eu não deveria simplesmente sumir? É por isso que sempre desapareço, mas ainda não encontrei o motivo pelo qual eu sempre reapareço - talvez seja porque, acima de tudo, sou humano; mais humano do que todos.
Sempre dizemos um ao outro que um dia vamos fugir, mas será que existe um lugar para onde fugirmos? Eu fujo de tudo quando vou até você, agora aguardo que você me mostre onde fica esse porto seguro que eu desconheço.
Escrever tudo isso é engraçado porque, quando estou próximo a você, não consigo nem chegar perto de pronunciar essas palavras - talvez nem precise pronunciá-las. Às vezes prefiro simplesmente olhar você, seus olhos, ou simplesmente saber que você está por aí, a te dizer algo.
Sinto saudades, espero que você esteja bem.
--------------
Escrevo hoje para você porque você é a única pessoa que tenho para escrever. Por mais que você não pense tanto em mim quanto eu penso em você e talvez, na verdade, nem eu pense tanto em você quanto eu acho que penso.
O quarto em que você se encontra é indiferente; seja um hotel em um lugar maravilhoso, seja em um apertado quarto de uma cidade grande, a solidão consegue te encontrar e atacar. Você sai pelas ruas e, quanto mais pessoas passam ao seu redor, mais sozinho e pequeno você se sente.
O escritor é um paradoxo - ele não gosta de escrever, se sentiria eternamente feliz se nunca mais precisasse de um papel; exalta a arte por ser uma válvula de escape.
Eu me pergunto se você enxerga o mundo como eu, se sabe como é árduo ter de ir lá fora. Às vezes me pergunto se sairia se não precisasse comer ou de dinheiro, de vencer nessa batalha insana da vida. Para que sairia do quarto? Mas acontece que a lua e o ar da madrugada trazem o mundo para o escritor e mesmo que ele se tranque em seu quarto, vai estar em contato com as coisas como são. Enquanto houver mundo, mesmo de olhos fechados, o sentirei.
Então, quando a noite ataca mais fortemente, saio na varanda, olho a chuva, procuro nas janelas luzes e pessoas que se sintam como eu, mas não encontro. Penso em que você deve estar fazendo, se está deitada a olhar a luz de um abajur e a pensar nessas coisas, se está dormindo e tendo um sonho feliz, em outro mundo.
Será que realmente tenho o direito de lhe escrever? Alguém que enxerga as coisas dessa forma deve espalhar esse vírus? Será que eu não deveria simplesmente sumir? É por isso que sempre desapareço, mas ainda não encontrei o motivo pelo qual eu sempre reapareço - talvez seja porque, acima de tudo, sou humano; mais humano do que todos.
Sempre dizemos um ao outro que um dia vamos fugir, mas será que existe um lugar para onde fugirmos? Eu fujo de tudo quando vou até você, agora aguardo que você me mostre onde fica esse porto seguro que eu desconheço.
Escrever tudo isso é engraçado porque, quando estou próximo a você, não consigo nem chegar perto de pronunciar essas palavras - talvez nem precise pronunciá-las. Às vezes prefiro simplesmente olhar você, seus olhos, ou simplesmente saber que você está por aí, a te dizer algo.
Sinto saudades, espero que você esteja bem.
quinta-feira, 7 de maio de 2009
Trecho de "Noites Brancas", de Dostoiévski
"(...)
- Há, se não sabe ainda, Nastenka, há em Petersburgo muitos recantos estranhos. Nesses lugares, não penetra, dir-se-ia, o sol que brilha para todos os outros habitantes de Petersburgo: o que ali penetra é um outro, um novo sol enviado expressamente para esses recantos e que ilumina tudo com uma outra luz especial. Ali, minha cara Nastenka, se leva uma vida muito diferente, que não se parece com aquela que borbulha ao nosso lado, mas que pode se passar num mundo desconhecido, e não entre nós, em nossa época séria, ultra-séria. Essa vida é uma mistura de algo puramente fantástico, furiosamente ideal e, ao mesmo tempo - ai de mim, Nastenka! - enfadonhamente prosaico e ordinário, para não dizer inverossimilmente vulgar.
-Puxa! Ah! Meu Deus, que prefácio! Que me falta ouvir ainda?
-Ouvirá, Nastenka (parece-me que nunca me fatigarei de lhe chamar Nastenka), vai ouvir que nesses recantos habitam seres estranhos: os sonhadores. O sonhador, se quisermos defini-lo em todos os pormenores, não é um homem, mas sabe? Uma espécie de criatura do gênero neutro. Ele jaz na maior parte do tempo em algum canto inacessível, como se se escondesse da luz do dia e, uma vez retirado para o seu refúgio, gruda-se ao seu canto como o caracol, ou pelo menos parece-me muito, a esse respeito, com esse curioso animal, que é ao mesmo tempo animal e casa e que se chama tartaruga. Na sua opinião, porque ama ele de tal maneira suas quatro paredes pintadas obrigatoriamente de verde, sujas, tristes, enegrecidas de fumo além do permitido? Por que esse ridículo senhor, quando o vem visitar um de seus raros conhecidos (ele faz tantas que finalmente todos os seus conhecidos desaparecem), por que esse homem o acolhe com tanto embaraço, tanta perturbação no rosto, e confusão, como se acabasse de cometer um crime, lá, entre as suas quatro paredes, como se fabricasse notas falsas ou versinhos para mandar a alguma revista com uma carta anônima, precisando que o verdadeiro poeta morreu e que seu amigo considera como um dever sagrado publicar sua obra? Por que, diga-me, Nastenka, a convrsa custa tanto a travar-se entre esses dois interlocutores? Por que nenhum riso, nenhuma palavra mais viva surge, na casa onde esse amigo subitamente entrou e está inquieto, esse que em outra circunstância ama tanto o riso e as palavras brilhantes, e os discursos sobre o belo sexo, e outros assuntos divertidos? Por que então, enfim, esse amigo, provavelmente um conhecido recente, desde a primeira visita - pois em semelhante caso não haverá segunda, e ele não voltará mais -, por que esse próprio visitante está tão perturbado, tão arrefecido, com todo o seu espírito (se é que o tem), ao ver a expressão alterada de seu anfitrião, o qual, por seu turno, está agora completamente perdido e desprovido do seu último grão de bom senso, depois de esforços gigantescos, mas vãos, para aplainar e ornar a conversa, mostra-lhe também seu hábito da sociedade, falar também do belo sexo, e, ao menos por esta submissão, aprazer ao pobre homem extraviado, caído por engano em sua casa? Por que finalmente o visitante apanha o chapéu à pressa e se vai, rápido, ao se lembrar de repente dum compromisso absolutamente inevitável, que nunca existiu, libera sofrivelmente a mão dos quentes apertos de seu hospedeiro, encarniçado em manifestar seu desgosto em recuperar o tempo perdido? Por que, ao despedir-se, o amigo tem um largo sorriso, logo que chega à rua, e promete a si mesmo voltar à casa desse original - se bem que esse original seja no fundo um excelente rapaz -, e ao mesmo tempo é incapaz de recusar à sua imaginação uma pequena fantasia: comparar, mesmo de longe, a fisionomia do interlocutor de agora durante toda a entrevista, com o aspecto desse desgraçado gatinho enxovalhado, apavorado, torturado de todas as maneiras pelas crianças que o aprisionaram traiçoeiramente, e que, confuso ao extremo, fugiu-lhes enfim para debaixo da mesa na obscuridade, e lá deve com vagar, durante uma boa hora, se arrepiar, se molhar e lavar com as duas patas, pequeno focinho maltratado, e depois disto, com um olho hostil, olhar longamente a natureza e a vida, e mesmo os sobejos do repasto dos donos que lhe guargou uma cozinheira cariodosa?
-Escute um momento - interrompeu Nastenka, que todo o tempo me ouvia com espanto, olhos e boca abertos -, escute: eu não sei absolutamente por que tudo isso aconteceu e por que você me apresenta perguntas tão cômicas. Mas o que sei bem é que todas essas aventuras foram unicamente a você que aconteceram.
-Sem dúvida nenhuma - respondi, com expressão mais séria.
-Então, se não há dúvida nenhuma, continue, poios estou ansiosa por saber como isso terminará.
-Quer saber, Nastenka, o que fez no seu canto o nosso herói, ou para dizer melhor, o que fiz eu, pois que o herói de toda a aventura sou eu, na minha própria e modesta pessoa? Quer saber por que estive assim transtornado e perdido por todo o dia, depois da visita inesperada de meu amigo? Quer saber por que estive assim transtornado e perdido por todo o dia, depois da visita inesperada de meu amigo? Quer saber por que corri, tendo enrubescido assim quando se abriu a porta de meu quarto, por que não soube receber o visitante e sucumbi tão vergonhosamente ao peso de minha própria hospitalidade?
-Está bem, sim, sim! - respondeu Nastenka. - É isso que desejo saber. Escute: você sabe contar muito bem, mas não poderia contar com menos perfeição? De outro modo, quando você fala, dir-se-ia que lê num livro.
-Nastenka - respondi com voz grave e severa, mal podendo conter o riso -, minha cara Nastenka, eu sei que conto bem, mas perdoe-me, não sei contar de outro modo. Neste momento, minha cara Nastenka, eu me assemelho ao espírito do rei Salomão que ficou mil anos numa ânfora fechada a sete chaves, e que finalmente foi libertado. Neste momento, minha cara Nastenka, em que nos reunimos de novo depois de tão longa separação, pois eu a conheço há muito tempo, Nastenka, pois desde há longo tempo eu já procurava uma certa pessoa, e isto significa que eu procurava, a você, e que estávamos destinados a nos revermos agora - neste momento abriram-se na minha cabeça milhares de válvulas, e tenho que me exprimir numa torrente de palavras, se não sufocarei. Assim, suplico-lhe não me interromper, Nastenka, mas ouvir com submissão e docilidade; senão me calarei.
-Não, não, não! Não quero! Fale! Não direi mais uma palavra.
-Então continuo. Nastenka, minha amiga, há no meu dia uma hora que eu amo extraordinariamente. É aquela em que se acabam quase todos os afazeres, funções e obrigações, e em que todo mundo se apressa a voltar para casa, para jantar ou descansar, e ao mesmo tempo, a caminho imagina ainda outros motivos de alegria, para a noite, e para o tempo que fica livre. Àquela hora, nosso herói também - pois vou me permitir Nastenka, fazer meu relato na terceira pessoa, porque na primeira eu teria muita vergonha -, assim, a essa hora, nosso herói também, que aliás não é um ocioso, segue os outros. Mas uma estranha sensação de contentamento se espalha no seu rosto pálido, como se ligeiramente fanado. Não é indiferente ao pôr-do-sol, que lentamente se extingue no céu frio de Petersburgo. Se dissesse que ele o olha, eu mentiria; não olha para ele, contempla-o sem se dar conta, como um homem fatigado ou ocupado ao mesmo tempo com outro objeto mais interessante, de maneira que por instantes apenas, quase involuntariamente, ele pode conceder tempo àquilo que o cerca. Está satisfeito, pois acabou, até o dia seguinte, com assuntos que o aborrecem, e contente como um estudante que se libertou da escola e que corre para os jogos e brincadeiras prediletos.
Olhei-o furtivamente, Nastenka: verá logo que esse sentimento de alegria, felizmente, já lhe agiu sobre os fracos nervos e sobre a imaginação excitada de forma doentia. Atenção, ele pensa em alguma coisa... Você calcula: em seu janta? Na noite de hoje? Que olha ele assim? Aquele senhor grave, que acaba de saudar tão pitorescamente uma dama que passou por ele, não há senão um instante, em sua elegante carruagem, em sua brilhante caleche? Não, Nastenka, que tem ele agora a fazer de todas essas misérias? Neste momento ele é um homem rico de sua vida interior; ficou rico de repente, e o último raio do sol poente não brilhou inutilmente para ele, e fez surgir de seu coração reaquecido todo um enxame de impressões. Agora, mal repara no caminho no qual outrora o mínimo pormenor podia chocá-lo. Agora a deusa Fantasia (se leu Jukovski, minha cara Nastenka) teceu com mão caprichosa sua trama de ouro e desenvolveu diante dele os arabescos de uma vida maravilhosa, inaudita e - quem sabe? - talvez com mão caprichosa, tenha-o transportado ao sétimo céu de cristal, deste excelente passio de granito que o leva à sua casa. Procure detê-lo agora, pergunte-lhe de repente onde está ele nesse momento, por que ruas passou; estou certo, não se lembrará de nada, onde esteve, nem onde está no momento, e, corando de despeito, inventará não importa o quê para salvar as aparências.
Eis aí por que estremeceu tão fortemente, quase gritou, e olhou à sua volta com pavor, quando uma velha muito respeitável o fez parar cortesmente no meio da calçada e lhe perguntou pelo caminho, que ela havia perdido. Os supercílios franzidos de enfado, continua sua rota, mal reparando que mais de um transeunte sorriu, ao olhá-lo, e se voltou para o ver, e que uma menina, depois de se ter afastado dele com medo, se pôs a rir muito alto, olhando bem seu largo sorriso contemplativo e os seus gestos. Mas foi isempre a mesma Fantasia que levou no seu vôo jovial não só a velha, como também os transeuntes curiosos, e a menina risonha, e os homens que ceiam nos barcos que obstruem o Fontanka (suponhamos que o nosso herói passava justamente por lá nesse momento); ela envolveu maliciosamente tudo e todos no seu véu, como moscas numa teia de aranha, e com esta nova aquisição o original entrou enfim, em sua asa, na sua amada toca, sentou-se à mesa, há muito já acabou de jantar e só se deu conta do que o cercava quando a penstiva e eternamente aflita Matrena, que o serve, retirou a toalha e lhe estendeu o ca-chimbo; voltou a si e com espanto se lembrou que acabara de jantar, sem querer ter reparado como isto acontecera.
No aposento descera a obscuridade; sua alma está vazia e triste; todo um reino de fantasias se desmoronou à sua volta, desmoronou sem deixar vestígios, sem ruído num tumulto, passou como um sonho e ele nem se lembra que teve essas ilusões. Mas uma espécie de obscura sensação, que magoa e lhe agita ligeiramente o peito, uma espécie de desejo novo, seduz, afaga e irrita sua imaginação, e suscita furtivamente todo um enxame de novos fantasmas. No quarto exíguo reina o silêncio; a solidão e a preguiça lisonjeiam a imaginação; ela se inflama rapidamente, rapidamente atinge a ebulição, como a água na cafeteira da velha Matrena que, impertubável, se ocupa, na cozinha ao lado, em preparar-lhe o café. Ei-la que já se evola em ligeiras espirais, e o livro apanhado sem objetivo, ao acaso, cai das mãos do meu sonhador, que não chegou à terceira página. Sua imaginação de novo se sobreexcita, e subitamente, outra vez, um novo universo, uma nova vida encantadora, surge-lhe aos olhos em brilhante perspectiva. Novo sonho: nova felicidade! novo trago de um veneno delicioso, refinado! Oh! De que lhe serve a nossa vida? Ao seu olhar seduzido, você e eu, Nastenka, vivemos uma vida tão preguiçosa, tão lenta, tão largada! Ao seu olhar estamos todos tão descontentes com a nossa sorte, tão fatigados de nossa existência! E em verdade, considere, com efeito, como, à primeira vista, tudo entre nós é frio, amargo, como que hostil... "Os pobres diabos!" pensa o meu sonhador. Não admira nada que ele assim pense! Olhe os fantasmas feéricos que se formam diante dele, feiticeiros, caprichosos, largamente e sem limites, em um animado quadro fantástico, em que se encontra no primeiro plano, naturalmente, primeira figura, o nosso próprio sonhador em sua preciosa pessoa. Olhe: que aventuras variadas, que enxame infinito de sonhos exaltados! Você perguntará, talvez, com que sonha ele? Para que perguntar? Mas em tudo... no papel do poeta, primeiro desconhecido, depois glorificado; em sua amizade com Hoffmann; na matança de são Bartolomeu; em Diana Movbray; em Effie Deans; nos prelados em concílio, e em Huss diante deles; na revolta dos mortos em "Roberto, o Diabo" (lembra-se da música? Cheira a cemitério!); em Mina e Brinda; na batalha de Berezina; na leitura de um poema em casa da condessa V... a D... a; em Danton; em Cleópatra e i suoi amanti, na casinha de Kolomna; num cantinho para ele e, ao seu lado, uma criatura amada que o escuta, numa noite de inverno, sua pequena boca e os olhinhos bem abertos - como você me escuta neste momento, ó meu pequeno anjo!...
Não, Nastenka, que lhe importa, a ele, preguiçooso, voluptuoso, esta vida a que aspiramos de tal modo você e eu? Pensa que é uma pobre vida, miserável, sem adivinhar que, para ele também, talvez, um dia soará a hora lamentável em que soluçante e desesperada, sobre o seio, sem ouvir a tempestade desencadeada sob um céu lúgubre, sem ouvir o vento que arrancava e levava as lágrimas de seus cílios negros? É possível que tudo isto não tenha sido senão sonho, e este jardim melancólico, abandonado e selvagem, com suas alamedas forradas de musgo, solitário, intratável, onde tão freqüentemente passeavam os dois, esperavam, desespeeravam, amavam, amavam-se um ao outro, tanto tempo, tão longo tempo e tão ternamente! E essa velha morada ancestral, bizarra, onde ela viveu tantos anos solitária e triste com seu velho marido, rabugento, perpetuamente calado e bilioso, que os atemorizava, a eles, tímidos como crianças, que melancólicos e apavorados se secondiam um do outro seu amor? Como se atormentavam, como temiam, como era puro e inocente o seu amor e quanto (a coisa é muito natural, Nastenka) as pessoas eram malvadas! E, meu Deus, não foi ela que reencontrou em seguida, longe das fronteiras da sua terra natal, sob um céu estrangeiro, meridional, causticante, na maravilhosa Cidade Eterna, no tumulto de um baile, ao ruído da música, em um palazzo (obrigatoriamente um palazzo) mergulhado em um mar de fogos, sobre esse balcão enguirlandado de mirtos e de rsas, onde, tendo-a reconhecido, ela tirou tão apressadamente sua máscara e, sussurrando: "Eu sou livre", trêmula, soluçante, atirou-se em seus braços; então com um grito de entusiasmo, estreitados um contra o outro, esqueceram, num minuto, desgosto e separação e todos os tormentos da casa e o marido soturno e o sombrio jardim na pátria longínqua e o banco no qual, depois de um último beijo apaixonado, ela se tinha desprendido do seu amplexo, petrificada num sofrimento sem esperança... Oh! confesse, minha cara Nastenka, pode-se fugir, perturbar-se e corar como um colegial que acaba de introduzir no bolso a maçã furtada no pomar vizinho, quando um rapaz sadio e alto, alegre companheiro e belo conversador, seu conhecido, sem ser convidado abre a porta e grita como se fosse nada: "Sou eu, meu caro, chego neste momento de Pavlovsk!" Meu Deus, o velho conde está morto, eis finalmente a felicidade, uma indizível felicidade, e logo agora chega-lhe gente de Pavlovsk.
(...)"
- Há, se não sabe ainda, Nastenka, há em Petersburgo muitos recantos estranhos. Nesses lugares, não penetra, dir-se-ia, o sol que brilha para todos os outros habitantes de Petersburgo: o que ali penetra é um outro, um novo sol enviado expressamente para esses recantos e que ilumina tudo com uma outra luz especial. Ali, minha cara Nastenka, se leva uma vida muito diferente, que não se parece com aquela que borbulha ao nosso lado, mas que pode se passar num mundo desconhecido, e não entre nós, em nossa época séria, ultra-séria. Essa vida é uma mistura de algo puramente fantástico, furiosamente ideal e, ao mesmo tempo - ai de mim, Nastenka! - enfadonhamente prosaico e ordinário, para não dizer inverossimilmente vulgar.
-Puxa! Ah! Meu Deus, que prefácio! Que me falta ouvir ainda?
-Ouvirá, Nastenka (parece-me que nunca me fatigarei de lhe chamar Nastenka), vai ouvir que nesses recantos habitam seres estranhos: os sonhadores. O sonhador, se quisermos defini-lo em todos os pormenores, não é um homem, mas sabe? Uma espécie de criatura do gênero neutro. Ele jaz na maior parte do tempo em algum canto inacessível, como se se escondesse da luz do dia e, uma vez retirado para o seu refúgio, gruda-se ao seu canto como o caracol, ou pelo menos parece-me muito, a esse respeito, com esse curioso animal, que é ao mesmo tempo animal e casa e que se chama tartaruga. Na sua opinião, porque ama ele de tal maneira suas quatro paredes pintadas obrigatoriamente de verde, sujas, tristes, enegrecidas de fumo além do permitido? Por que esse ridículo senhor, quando o vem visitar um de seus raros conhecidos (ele faz tantas que finalmente todos os seus conhecidos desaparecem), por que esse homem o acolhe com tanto embaraço, tanta perturbação no rosto, e confusão, como se acabasse de cometer um crime, lá, entre as suas quatro paredes, como se fabricasse notas falsas ou versinhos para mandar a alguma revista com uma carta anônima, precisando que o verdadeiro poeta morreu e que seu amigo considera como um dever sagrado publicar sua obra? Por que, diga-me, Nastenka, a convrsa custa tanto a travar-se entre esses dois interlocutores? Por que nenhum riso, nenhuma palavra mais viva surge, na casa onde esse amigo subitamente entrou e está inquieto, esse que em outra circunstância ama tanto o riso e as palavras brilhantes, e os discursos sobre o belo sexo, e outros assuntos divertidos? Por que então, enfim, esse amigo, provavelmente um conhecido recente, desde a primeira visita - pois em semelhante caso não haverá segunda, e ele não voltará mais -, por que esse próprio visitante está tão perturbado, tão arrefecido, com todo o seu espírito (se é que o tem), ao ver a expressão alterada de seu anfitrião, o qual, por seu turno, está agora completamente perdido e desprovido do seu último grão de bom senso, depois de esforços gigantescos, mas vãos, para aplainar e ornar a conversa, mostra-lhe também seu hábito da sociedade, falar também do belo sexo, e, ao menos por esta submissão, aprazer ao pobre homem extraviado, caído por engano em sua casa? Por que finalmente o visitante apanha o chapéu à pressa e se vai, rápido, ao se lembrar de repente dum compromisso absolutamente inevitável, que nunca existiu, libera sofrivelmente a mão dos quentes apertos de seu hospedeiro, encarniçado em manifestar seu desgosto em recuperar o tempo perdido? Por que, ao despedir-se, o amigo tem um largo sorriso, logo que chega à rua, e promete a si mesmo voltar à casa desse original - se bem que esse original seja no fundo um excelente rapaz -, e ao mesmo tempo é incapaz de recusar à sua imaginação uma pequena fantasia: comparar, mesmo de longe, a fisionomia do interlocutor de agora durante toda a entrevista, com o aspecto desse desgraçado gatinho enxovalhado, apavorado, torturado de todas as maneiras pelas crianças que o aprisionaram traiçoeiramente, e que, confuso ao extremo, fugiu-lhes enfim para debaixo da mesa na obscuridade, e lá deve com vagar, durante uma boa hora, se arrepiar, se molhar e lavar com as duas patas, pequeno focinho maltratado, e depois disto, com um olho hostil, olhar longamente a natureza e a vida, e mesmo os sobejos do repasto dos donos que lhe guargou uma cozinheira cariodosa?
-Escute um momento - interrompeu Nastenka, que todo o tempo me ouvia com espanto, olhos e boca abertos -, escute: eu não sei absolutamente por que tudo isso aconteceu e por que você me apresenta perguntas tão cômicas. Mas o que sei bem é que todas essas aventuras foram unicamente a você que aconteceram.
-Sem dúvida nenhuma - respondi, com expressão mais séria.
-Então, se não há dúvida nenhuma, continue, poios estou ansiosa por saber como isso terminará.
-Quer saber, Nastenka, o que fez no seu canto o nosso herói, ou para dizer melhor, o que fiz eu, pois que o herói de toda a aventura sou eu, na minha própria e modesta pessoa? Quer saber por que estive assim transtornado e perdido por todo o dia, depois da visita inesperada de meu amigo? Quer saber por que estive assim transtornado e perdido por todo o dia, depois da visita inesperada de meu amigo? Quer saber por que corri, tendo enrubescido assim quando se abriu a porta de meu quarto, por que não soube receber o visitante e sucumbi tão vergonhosamente ao peso de minha própria hospitalidade?
-Está bem, sim, sim! - respondeu Nastenka. - É isso que desejo saber. Escute: você sabe contar muito bem, mas não poderia contar com menos perfeição? De outro modo, quando você fala, dir-se-ia que lê num livro.
-Nastenka - respondi com voz grave e severa, mal podendo conter o riso -, minha cara Nastenka, eu sei que conto bem, mas perdoe-me, não sei contar de outro modo. Neste momento, minha cara Nastenka, eu me assemelho ao espírito do rei Salomão que ficou mil anos numa ânfora fechada a sete chaves, e que finalmente foi libertado. Neste momento, minha cara Nastenka, em que nos reunimos de novo depois de tão longa separação, pois eu a conheço há muito tempo, Nastenka, pois desde há longo tempo eu já procurava uma certa pessoa, e isto significa que eu procurava, a você, e que estávamos destinados a nos revermos agora - neste momento abriram-se na minha cabeça milhares de válvulas, e tenho que me exprimir numa torrente de palavras, se não sufocarei. Assim, suplico-lhe não me interromper, Nastenka, mas ouvir com submissão e docilidade; senão me calarei.
-Não, não, não! Não quero! Fale! Não direi mais uma palavra.
-Então continuo. Nastenka, minha amiga, há no meu dia uma hora que eu amo extraordinariamente. É aquela em que se acabam quase todos os afazeres, funções e obrigações, e em que todo mundo se apressa a voltar para casa, para jantar ou descansar, e ao mesmo tempo, a caminho imagina ainda outros motivos de alegria, para a noite, e para o tempo que fica livre. Àquela hora, nosso herói também - pois vou me permitir Nastenka, fazer meu relato na terceira pessoa, porque na primeira eu teria muita vergonha -, assim, a essa hora, nosso herói também, que aliás não é um ocioso, segue os outros. Mas uma estranha sensação de contentamento se espalha no seu rosto pálido, como se ligeiramente fanado. Não é indiferente ao pôr-do-sol, que lentamente se extingue no céu frio de Petersburgo. Se dissesse que ele o olha, eu mentiria; não olha para ele, contempla-o sem se dar conta, como um homem fatigado ou ocupado ao mesmo tempo com outro objeto mais interessante, de maneira que por instantes apenas, quase involuntariamente, ele pode conceder tempo àquilo que o cerca. Está satisfeito, pois acabou, até o dia seguinte, com assuntos que o aborrecem, e contente como um estudante que se libertou da escola e que corre para os jogos e brincadeiras prediletos.
Olhei-o furtivamente, Nastenka: verá logo que esse sentimento de alegria, felizmente, já lhe agiu sobre os fracos nervos e sobre a imaginação excitada de forma doentia. Atenção, ele pensa em alguma coisa... Você calcula: em seu janta? Na noite de hoje? Que olha ele assim? Aquele senhor grave, que acaba de saudar tão pitorescamente uma dama que passou por ele, não há senão um instante, em sua elegante carruagem, em sua brilhante caleche? Não, Nastenka, que tem ele agora a fazer de todas essas misérias? Neste momento ele é um homem rico de sua vida interior; ficou rico de repente, e o último raio do sol poente não brilhou inutilmente para ele, e fez surgir de seu coração reaquecido todo um enxame de impressões. Agora, mal repara no caminho no qual outrora o mínimo pormenor podia chocá-lo. Agora a deusa Fantasia (se leu Jukovski, minha cara Nastenka) teceu com mão caprichosa sua trama de ouro e desenvolveu diante dele os arabescos de uma vida maravilhosa, inaudita e - quem sabe? - talvez com mão caprichosa, tenha-o transportado ao sétimo céu de cristal, deste excelente passio de granito que o leva à sua casa. Procure detê-lo agora, pergunte-lhe de repente onde está ele nesse momento, por que ruas passou; estou certo, não se lembrará de nada, onde esteve, nem onde está no momento, e, corando de despeito, inventará não importa o quê para salvar as aparências.
Eis aí por que estremeceu tão fortemente, quase gritou, e olhou à sua volta com pavor, quando uma velha muito respeitável o fez parar cortesmente no meio da calçada e lhe perguntou pelo caminho, que ela havia perdido. Os supercílios franzidos de enfado, continua sua rota, mal reparando que mais de um transeunte sorriu, ao olhá-lo, e se voltou para o ver, e que uma menina, depois de se ter afastado dele com medo, se pôs a rir muito alto, olhando bem seu largo sorriso contemplativo e os seus gestos. Mas foi isempre a mesma Fantasia que levou no seu vôo jovial não só a velha, como também os transeuntes curiosos, e a menina risonha, e os homens que ceiam nos barcos que obstruem o Fontanka (suponhamos que o nosso herói passava justamente por lá nesse momento); ela envolveu maliciosamente tudo e todos no seu véu, como moscas numa teia de aranha, e com esta nova aquisição o original entrou enfim, em sua asa, na sua amada toca, sentou-se à mesa, há muito já acabou de jantar e só se deu conta do que o cercava quando a penstiva e eternamente aflita Matrena, que o serve, retirou a toalha e lhe estendeu o ca-chimbo; voltou a si e com espanto se lembrou que acabara de jantar, sem querer ter reparado como isto acontecera.
No aposento descera a obscuridade; sua alma está vazia e triste; todo um reino de fantasias se desmoronou à sua volta, desmoronou sem deixar vestígios, sem ruído num tumulto, passou como um sonho e ele nem se lembra que teve essas ilusões. Mas uma espécie de obscura sensação, que magoa e lhe agita ligeiramente o peito, uma espécie de desejo novo, seduz, afaga e irrita sua imaginação, e suscita furtivamente todo um enxame de novos fantasmas. No quarto exíguo reina o silêncio; a solidão e a preguiça lisonjeiam a imaginação; ela se inflama rapidamente, rapidamente atinge a ebulição, como a água na cafeteira da velha Matrena que, impertubável, se ocupa, na cozinha ao lado, em preparar-lhe o café. Ei-la que já se evola em ligeiras espirais, e o livro apanhado sem objetivo, ao acaso, cai das mãos do meu sonhador, que não chegou à terceira página. Sua imaginação de novo se sobreexcita, e subitamente, outra vez, um novo universo, uma nova vida encantadora, surge-lhe aos olhos em brilhante perspectiva. Novo sonho: nova felicidade! novo trago de um veneno delicioso, refinado! Oh! De que lhe serve a nossa vida? Ao seu olhar seduzido, você e eu, Nastenka, vivemos uma vida tão preguiçosa, tão lenta, tão largada! Ao seu olhar estamos todos tão descontentes com a nossa sorte, tão fatigados de nossa existência! E em verdade, considere, com efeito, como, à primeira vista, tudo entre nós é frio, amargo, como que hostil... "Os pobres diabos!" pensa o meu sonhador. Não admira nada que ele assim pense! Olhe os fantasmas feéricos que se formam diante dele, feiticeiros, caprichosos, largamente e sem limites, em um animado quadro fantástico, em que se encontra no primeiro plano, naturalmente, primeira figura, o nosso próprio sonhador em sua preciosa pessoa. Olhe: que aventuras variadas, que enxame infinito de sonhos exaltados! Você perguntará, talvez, com que sonha ele? Para que perguntar? Mas em tudo... no papel do poeta, primeiro desconhecido, depois glorificado; em sua amizade com Hoffmann; na matança de são Bartolomeu; em Diana Movbray; em Effie Deans; nos prelados em concílio, e em Huss diante deles; na revolta dos mortos em "Roberto, o Diabo" (lembra-se da música? Cheira a cemitério!); em Mina e Brinda; na batalha de Berezina; na leitura de um poema em casa da condessa V... a D... a; em Danton; em Cleópatra e i suoi amanti, na casinha de Kolomna; num cantinho para ele e, ao seu lado, uma criatura amada que o escuta, numa noite de inverno, sua pequena boca e os olhinhos bem abertos - como você me escuta neste momento, ó meu pequeno anjo!...
Não, Nastenka, que lhe importa, a ele, preguiçooso, voluptuoso, esta vida a que aspiramos de tal modo você e eu? Pensa que é uma pobre vida, miserável, sem adivinhar que, para ele também, talvez, um dia soará a hora lamentável em que soluçante e desesperada, sobre o seio, sem ouvir a tempestade desencadeada sob um céu lúgubre, sem ouvir o vento que arrancava e levava as lágrimas de seus cílios negros? É possível que tudo isto não tenha sido senão sonho, e este jardim melancólico, abandonado e selvagem, com suas alamedas forradas de musgo, solitário, intratável, onde tão freqüentemente passeavam os dois, esperavam, desespeeravam, amavam, amavam-se um ao outro, tanto tempo, tão longo tempo e tão ternamente! E essa velha morada ancestral, bizarra, onde ela viveu tantos anos solitária e triste com seu velho marido, rabugento, perpetuamente calado e bilioso, que os atemorizava, a eles, tímidos como crianças, que melancólicos e apavorados se secondiam um do outro seu amor? Como se atormentavam, como temiam, como era puro e inocente o seu amor e quanto (a coisa é muito natural, Nastenka) as pessoas eram malvadas! E, meu Deus, não foi ela que reencontrou em seguida, longe das fronteiras da sua terra natal, sob um céu estrangeiro, meridional, causticante, na maravilhosa Cidade Eterna, no tumulto de um baile, ao ruído da música, em um palazzo (obrigatoriamente um palazzo) mergulhado em um mar de fogos, sobre esse balcão enguirlandado de mirtos e de rsas, onde, tendo-a reconhecido, ela tirou tão apressadamente sua máscara e, sussurrando: "Eu sou livre", trêmula, soluçante, atirou-se em seus braços; então com um grito de entusiasmo, estreitados um contra o outro, esqueceram, num minuto, desgosto e separação e todos os tormentos da casa e o marido soturno e o sombrio jardim na pátria longínqua e o banco no qual, depois de um último beijo apaixonado, ela se tinha desprendido do seu amplexo, petrificada num sofrimento sem esperança... Oh! confesse, minha cara Nastenka, pode-se fugir, perturbar-se e corar como um colegial que acaba de introduzir no bolso a maçã furtada no pomar vizinho, quando um rapaz sadio e alto, alegre companheiro e belo conversador, seu conhecido, sem ser convidado abre a porta e grita como se fosse nada: "Sou eu, meu caro, chego neste momento de Pavlovsk!" Meu Deus, o velho conde está morto, eis finalmente a felicidade, uma indizível felicidade, e logo agora chega-lhe gente de Pavlovsk.
(...)"
domingo, 26 de abril de 2009
Fantasiado
A brasa do cigarro do músico não é a mesma do advogado ou do empresário; ela o busca no fundo de sua alma e o alivia de si mesmo o colocando mais próximo da morte.
O músico está sempre farto de si mesmo; cada pessoa vê o mundo com as cores que lhe convém - o músico o vê em preto e branco. Ele está nos falsetes de Thom Yorke, na cama solitária de Janis Joplin, na mescalina de Allen Ginsberg e na inquietação de Bob Dylan.
O músico não é naturalmente triste, mas a natureza quer que ele seja e o força a ser; ele escreve sobre o amor porque sabe que é incapaz de possuir o amor de uma mulher, escreve sobre a alegria porque a quer em sua vida e sabe que nunca a terá, escreve sobre a tristeza porque a vê o tempo todo e, finalmente, escreve sobre o medo porque é curioso - ele não tem nada a perder, não precisa sentir medo.
Quando se é feliz, a infelicidade é triste; quando se é infeliz, a felicidade se torna triste - não há saída. Ler e escrever são os piores hábitos viciosos; somados são o primeiro passo para a desesperança, sendo o segundo quando se vê esta na vida real.
Não há esperança em lugar nenhum, mas é bom que você viva acreditando nela.
O músico está sempre farto de si mesmo; cada pessoa vê o mundo com as cores que lhe convém - o músico o vê em preto e branco. Ele está nos falsetes de Thom Yorke, na cama solitária de Janis Joplin, na mescalina de Allen Ginsberg e na inquietação de Bob Dylan.
O músico não é naturalmente triste, mas a natureza quer que ele seja e o força a ser; ele escreve sobre o amor porque sabe que é incapaz de possuir o amor de uma mulher, escreve sobre a alegria porque a quer em sua vida e sabe que nunca a terá, escreve sobre a tristeza porque a vê o tempo todo e, finalmente, escreve sobre o medo porque é curioso - ele não tem nada a perder, não precisa sentir medo.
Quando se é feliz, a infelicidade é triste; quando se é infeliz, a felicidade se torna triste - não há saída. Ler e escrever são os piores hábitos viciosos; somados são o primeiro passo para a desesperança, sendo o segundo quando se vê esta na vida real.
Não há esperança em lugar nenhum, mas é bom que você viva acreditando nela.
quarta-feira, 22 de abril de 2009
Videotape
Hoje eu não acordei; o sol não tinha direito de subir ao céu e os carros movimentam as ruas porque são tolos. Talvez eu tenha acordado demais e por isso esteja aqui, no meu quarto, de pijama, com tudo fechado, escrevendo no escuro. É verdade que hoje não quero ver a luz, nao quero me ver ao reflexo do espelho, meus brincos, pulseiras, roupas, quero retirar tudo de mim; cabelo, sobrancelhas, quero raspar cada pêlo de meu corpo - retirar detalhe por detalhe que construí em minha personalidade até voltar a ser ninguém, voltar ao zero. Rasgar e queimar cada pequena lembrança desse caderno, desde um pedaço de pano de chão até uma flor tão destruída pelo tempo que já se tornou irreconhecível como uma. Fazer com que cada foto onde eu apareça no tempo simplesmente desapareça junto com os momentos nos quais elas foram tiradas. Junto com os momentos, que cada pessoa que esteve comigo me esqueça, me olhe e pense nunca ter me visto.
Quando tudo o que me liga ao mundo finalmente se apagar, quero que esse quarto se tranque para sempre e se mova para um lugar onde não exista nada além de meus CDs, livros, papés, lápis e o silênico da alma singular.
Que meu violão não se esqueça de mim, que eu não me esqueça dele e que eu não me esqueça de mim mesmo.
----------------------------------------
http://www.youtube.com/watch?v=-kCKob1YKOU
Quando tudo o que me liga ao mundo finalmente se apagar, quero que esse quarto se tranque para sempre e se mova para um lugar onde não exista nada além de meus CDs, livros, papés, lápis e o silênico da alma singular.
Que meu violão não se esqueça de mim, que eu não me esqueça dele e que eu não me esqueça de mim mesmo.
----------------------------------------
http://www.youtube.com/watch?v=-kCKob1YKOU
terça-feira, 14 de abril de 2009
Poema interior
Quanto menos fede o corpo
mais fede a alma
.
A maquiagem não esconde o ser
O mar alcança até as pedras mais claras
E é nos pensamentos mais profundos
que encontramos os sentimentos mais imundos
.
Quanto mais pesa o copo
menos encara a cara
.
Porque é nos olhos mais bonitos
que encontramos os maiores desesperos reprimidos
No álcool do bar, o alívio imediato
No escuro do quarto, o sofrimento intacto
.
Quanto mais farto o troco
mais se perde a calma
.
Quando se tudo tem
tudo tem importância
Mas de mochila vazia
o silêncio preenche a esperança
.
Quanto menos a pele cora
menos a mente aflora
.
Barreira, cegueira, muro mudo
aço, embaraço, pensamento a fora
Acaso, descaso, embaralha tudo
fecha essa guarda, vai embora
terça-feira, 24 de março de 2009
Fim da viagem
Depois de quatro anos, o homem caminhava novamente só pela praia. Sentia, em seu rosto, o suor escorrer-lhe violentamente e, em seus músculos, a fadiga contrair-lhe dolorosamente - e isso era bom; era como se sua mente se dividisse entre a atenção ao exterior, à sua vida pessoal e ao seu esforço físico e, quanto maior fosse esse esforço, menos seu pensamento se voltaria às áreas restantes.
Enquanto andava, de cabeça baixa, notou que algo mudara totalmente de quatro anos para cá: antes andava sempre de cabeça erguida, observando as pessoas e procurando em seus olhos seus sofrimentos, indignações e, por que não, alegrias. Agora, ao erguer a cabeça, o homem olhava a todos com indiferença.
Nunca havia sido um comunista, pixado muros, participado de protestos ou lutado abertamente contra o sistema, mas ao mesmo tempo, em sua vida, nunca havia conhecido alguém tão subversivo quanto ele próprio.
O fato era que a mulher que amava havia o abandonado neste dia e ele se sentia como se estivesse reconhecendo o que restara de seu mundo. Se antes olhava ao seu redor e ansiava justiça, mudança, agora olha ao seu redor e nada sente; é como se antes de a conhecer ele amasse todos e se preocupasse igualmente com todos e, ao conhecê-la, tivesse reunido todo esse amor em uma única pessoa, a qual jogou tudo no lixo; nada mais restava para ele.
Percebeu, então, que o fato de ela o ter abandonado era indiferente; o amor é optar por uma vida de alguns anos entre esta e a eternidade.
Sorriu, parando ao lado de um lixo e retirando uma foto do bolso, onde ele e sua ex-mulher sorriam para a câmera. Porém, ao olhar para o lixo, ficou novamente melancólico, guardando a foto em seu bolso outra vez.
Há, na vida, caminhos dos quais não se pode voltar.
Enquanto andava, de cabeça baixa, notou que algo mudara totalmente de quatro anos para cá: antes andava sempre de cabeça erguida, observando as pessoas e procurando em seus olhos seus sofrimentos, indignações e, por que não, alegrias. Agora, ao erguer a cabeça, o homem olhava a todos com indiferença.
Nunca havia sido um comunista, pixado muros, participado de protestos ou lutado abertamente contra o sistema, mas ao mesmo tempo, em sua vida, nunca havia conhecido alguém tão subversivo quanto ele próprio.
O fato era que a mulher que amava havia o abandonado neste dia e ele se sentia como se estivesse reconhecendo o que restara de seu mundo. Se antes olhava ao seu redor e ansiava justiça, mudança, agora olha ao seu redor e nada sente; é como se antes de a conhecer ele amasse todos e se preocupasse igualmente com todos e, ao conhecê-la, tivesse reunido todo esse amor em uma única pessoa, a qual jogou tudo no lixo; nada mais restava para ele.
Percebeu, então, que o fato de ela o ter abandonado era indiferente; o amor é optar por uma vida de alguns anos entre esta e a eternidade.
Sorriu, parando ao lado de um lixo e retirando uma foto do bolso, onde ele e sua ex-mulher sorriam para a câmera. Porém, ao olhar para o lixo, ficou novamente melancólico, guardando a foto em seu bolso outra vez.
Há, na vida, caminhos dos quais não se pode voltar.
quinta-feira, 19 de março de 2009
Sinais de fumaça
Caminhando pela cidade eu vi sinais de fumaça
que, entre outras coisas, me trazem mensagens de casa.
No meio das cinzas que se formam entre o primeiro e o próximo trago,
sinais de fumaça irradiam de meu próprio cigarro.
.
E me fazem lembrar que um dia eu tive um lar.
E me fazem lembrar que um dia eu tive um lar.
.
Na dicotomia entre mentira e sinceridade,
a opção mais sincera é que às vezes dispensa a verdade.
Mas como é um dia especial, precisamos comemorar;
vou brindar-lhes com a verdade, na verdade, nunca tive saudades de lá.
.
Mas eu preciso pensar que um dia eu tive um lar.
Mas eu preciso pensar que um dia eu tive um lar.
E me fazem lembrar que um dia eu tive um lar.
E me fazem lembrar que um dia eu tive um lar.
Mas eu preciso pensar que um dia eu tive um lar.
.
Mas eram só sinais de fumaça.
Mas eram só sinais de fumaça.
quinta-feira, 12 de março de 2009
Retrato
Misantropia e solidão.
Sou aquele que não tem passado,
o que está atrás é apenas uma página borrada.
Sou a desesperança esperançosa de Winston.
Sou a solidão de Raskolnikóf.
Sou a misantropia introspectiva de Jack Torrance.
Sou a falta de sentido da vida Meursault.
Sou a boca que te ama e há de te maltratar de Augusto dos Anjos.
Sou o delírio que te há de matar de Álvares de Azevedo.
Sou o vento que tudo traz de Arnaldo Antunes.
Não disperdiço papéis com negócios e afazeres,
o mundo é poesia, o mundo é tristeza.
Meu papel descreve o que já esteve na cabeça de todos
mas ninguém ousou escrever.
.
Café, estrada, mapas, acaso, papéis, solidão.
Sou aquele que ninguém vê, mas um dia todos hão de notar.
Porque é no nada que às vezes encontramos tudo.
Sou a dualidade paradoxal da personalidade humana
fichada, descrita, arquivada.
Sou a cortina que isola o sol.
Sou os olhos que observam a lua.
Sou as lágrimas que escorrem do desespero.
Sou a solidão das capitais.
Não fui, sou, nunca serei.
quinta-feira, 5 de março de 2009
segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009
Companhia na solidão do espelho
sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009
Vida Meursault

Vida Meursault
Aqui vamos nós de novo
caminhando em meio à multidão.
Ao nosso redor, as vozes de um povo
soam de um único coração.
.
Não vais lembrar
de quando era possível e preciso lutar.
Não vais lembrar
que o desafio continua no ar.
.
Aqui vamos nós de novo
e a esperança a nos deixar.
Os riscos na maçaneta da porta
de um homem que quer escapar
de um quarto de tristezas
e a vida a lhe pesar.
Carrega nos ombros o peso do mundo
e um pesadelo no olhar.
.
Ele vai esquecer
que há ainda pelos cantos um motivo pra viver.
Ele vai esquecer
que para haver o impossível, basta crer.
.
Ele vai esquecer
que há ainda pelos cantos um motivo pra viver.
Ele vai esquecer
que para tocar o infinito, basta crer
Assinar:
Postagens (Atom)